100 anos volvidos sobre 1917 e as Aparições de Nossa Senhora na Cova da Iria, o que pode haver ainda de novidade e de actual? As Aparições foram rapidamente aprovadas pela Igreja, vários Papas peregrinaram ao Santuário de Fátima, o “Segredo” foi já integralmente revelado, os dois videntes mais novos – Francisco e Jacinta – estão já canonizados e o processo de beatificação da Ir. Lúcia está em curso. Que interesse poderá Fátima e a sua Mensagem ter ainda para nós hoje?
Um olhar atento para a Mensagem de Fátima no seu conjunto (1916-1929) permite-nos identificar nos seus conteúdos as grandes verdades fundamentais da nossa fé: o mistério de Deus Uno e Trino, a Eucaristia, a Comunhão dos Santos, o papel de Nossa Senhora na vida da Igreja, o amor à Igreja e ao Papa, o apelo à oração, conversão e penitência tantas vezes repetido no Evangelho… conteúdos esses que permanecem atuais há 2000 anos, e que, ainda que “fora de moda” na sociedade dos nossos dias, nem por isso estão “desatualizados”.
A Mensagem de Fátima vem-nos relembrar a Verdade – “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida” (Jo 14, 6) – que não passa com o tempo, porque é eterna, e aponta-nos por isso, para o núcleo da nossa fé, pois vem lembrar-nos a centralidade de Deus na história, e o consequente apelo à oração/adoração; a Sua Misericórdia para connosco, e o consequente apelo à conversão; e o convite que Ele nos faz a tomarmos parte da História de Salvação da Humanidade, e o consequente apelo à penitência por amor.
Mas a atualidade da Mensagem de Fátima não se limita aos conteúdos da nossa fé que engloba no seu seio, pois também os seus pedidos se revestem ainda de uma grande pertinência. Tomemos por exemplo a “frase de clausura” das Aparições da Cova da Iria: “Não ofendam mais a Deus Nosso Senhor, que já está muito ofendido” (1917.10.13), que é hoje tão ou mais atual que há 100 anos atrás, e assim permanecerá enquanto o coração do homem andar longe do coração de Deus.
Intimamente ligado ao apelo à conversão, e revestido da mesma pertinência e atualidade, encontra-se um outro pedido feito por Nossa Senhora na Cova da Iria, o seu pedido mais insistente, que repetiu em todas as suas Aparições: “Quero que rezem o terço todos os dias”. Não há conversão sem oração, pelo que, para nos ajudar nesse percurso, nos é proposta uma forma de oração ao mesmo tão simples e acessível a todos como rica e eficaz para o nosso crescimento espiritual. Nas palavras de S. João Paulo II: “O Rosário transporta-nos misticamente para junto de Maria dedicada a acompanhar o crescimento humano de Cristo na casa de Nazaré. Isto permite-lhe educar-nos e plasmar-nos com a mesma solicitude, até que Cristo esteja formado em nós plenamente.” (O Rosário da Virgem Maria, 15). A oração diária do terço – através da meditação dos mistérios da vida de Jesus e de Nossa Senhora – permite-nos trazer o Evangelho na nossa mente, nos nossos lábios, nas nossas mãos e no nosso coração, fazendo do Evangelho rezado e meditado a nossa vida, pondo-o em prática.
Também o apelo à oração pelo Papa, presente de um modo particular na terceira parte do já revelado “Segredo”, não perdeu nenhuma da sua atualidade. Os Pastorinhos viram “um Bispo vestido de branco” mas, nas palavras da Ir. Lúcia ao Cardeal Bertone, “Não sabíamos o nome do Papa; Nossa Senhora não disse o nome do Papa. Não sabíamos se era Bento XV, Pio XII, Paulo VI ou João Paulo II, mas era o Papa que sofria e isso fazia-nos sofrer a nós também”. Hoje, o “Bispo vestido de branco” que “atravessa uma cidade em ruínas” e sobe “uma montanha escabrosa”, chama-se Francisco… e também ele se recomenda continuamente à nossa oração.
Por fim, há ainda o alerta que Nossa Senhora nos faz relativamente aos perigos de uma sociedade sem Deus, que nos é apresentado juntamente com o pedido de consagração ao seu Imaculado Coração para os prevenir. Efetivamente não há assim tanta diferença entre os perigos para os quais Nossa Senhora nos alertava há 100 anos atrás e os de hoje, sendo que essa diferença é para pior dado que, enquanto há 100 anos o “aplauso social” ia para a virtude, hoje o “aplauso social” vai para o pecado, sendo que nos é continuamente apresentado como “normal” aquilo que sabemos ser erro. Hoje, 100 anos mais tarde, temos “muitas outras Rússias” a “espalhar os seus erros pelo mundo” (1917.17.13).
No entanto, a solução para estes “erros espalhados pelo mundo” continua a ser a mesma, uma solução desconcertante de tão simples que é comparativamente com a complexidade do problema a resolver. A devoção ao Imaculado Coração de Maria não é uma devoção assente num pietismo superficial mas consiste na imitação da atitude permanente de Nossa Senhora, como nos ensina o Cardeal Ratzinger: “Portanto, «devoção» ao Imaculado Coração de Maria é aproximar-se desta atitude do coração, na qual o fiat – «seja feita a vossa vontade» – se torna o centro conformador de toda a existência” (Coment. Teol. ao “Segredo”).
Resta-nos ainda a promessa feita por Nossa Senhora a 13 de julho de 1917: “Por fim, o meu Imaculado Coração triunfará”… um triunfo que, vai acontecendo à medida que Deus vai triunfando no coração de cada um dos que a Ele se entrega por meio de Nossa Senhora, mas cuja plenitude se encontra ainda distante.
Ir. Maria Benedita Costa, asm