Fiquei extremamente contente ao saber que o Papa Francisco, no dia 12 de Dezembro de 2019, aprovou o decreto que reconhece as “virtudes heróicas” do Padre Américo, fundador da Obra da Rua. O Padre Américo nasceu em Galegos (Penafiel), a 23 de Outubro de 1887, e faleceu a 16 de Julho de 1956, após um acidente de carro em Campo, no Hospital de Santo António (Porto), tendo sido sepultado na Capela da Casa do Gaiato de Paço de Sousa.

De alguma forma sinto-me ligado ao Padre Américo e à Obra da Rua. Sendo eu natural de Avessadas (Marco de Canaveses), tão perto de Penafiel, de Paço de Sousa e de Beire, onde está a Casa do Calvário, forçosamente, na minha infância e juventude, ouvi falar destes lugares que agora visito devotamente. Sendo eu carmelita, há, pelo menos, três referências da sua vida que não me são indiferentes: estudou no Colégio do Carmo, em Penafiel; em 1923 ingressou no Convento de Vilariño da Ramallosa (Galiza), chegando a tomar o hábito de noviço franciscano com o nome de Frei Américo de Santa Teresa, saindo do mesmo a 14 de Agosto de 1924; o dia do seu falecimento foi no dia de Nossa Senhora do Carmo, 16 de Julho de 1956.

O “Pai Américo”, como lhe chamavam os Rapazes da Obra da Rua, ordenou-se padre aos 36 anos, entregando-se logo a visitar cadeias, hospitais e os tugúrios de famílias marginalizadas. Maria Manuela Lopes Cardoso afirma: “Os pobres eram a sua constante preocupação até mesmo a sua devoção». Marcelo Rebelo de Sousa vê o Padre Américo “como cidadão atento aos dramas da infância excluída ou em exclusão num Portugal a converter-se de rural em urbano e metropolitano. Como educador empenhado na primazia da afirmação da criança. Como cristão e sacerdote devotado na concretização das bem-aventuranças, na vivência de uma igreja serva e pobre, na antecipação do que viria a ser o espírito do Concílio Vaticano II”. Segundo D. Manuel Linda, bispo do Porto, “quando o padre Américo começou a recolher as crianças da zona mais deprimida de Portugal – que, porventura, era a zona do Barredo, nas margens do rio Douro, aqui no Porto – estava a fazer exactamente aquilo que era mais necessário naquela altura. Hoje, as condições mudaram, mas ele lembra-nos e espicaça a nossa consciência para o muito que há a fazer no campo das outras fragilidades”.

Hoje podemos dizer que os tempos do Padre Américo já lá vão e que agora toda a gente beneficia da assistência social do Estado. As condições económicas são outras e há subsídios para os pobres e mais frágeis. Isso é verdade. Mas também é verdade que continua em aumento a pobreza e os sem-abrigo, a exclusão, a escravidão economicista, a corrupção, a injustiça, a violência doméstica, os assassinatos e os roubos. O lema da Obra da Rua era: “nem prisão nem grades”. Infelizmente hoje as instituições de correcção de menores e as prisões estão com lotação quase esgotada. E, em muitos lados, a assistência é feita com “cara de vinagre” e frieza. O Padre Américo foi realmente um sacerdote da “igreja em saída”, não acomodada e lançada por caminhos lamacentos e ruelas das periferias. Toda a sua vida foi uma “revolução da ternura” (EG 88). E é só a Ternura que sobe aos altares!