A estória da imagem do Menino Jesus de Praga não é tão lenda assim. Que a primeira imagem é de cera, isso é verdade; bastará ir a Praga confirmá-lo. Que a origem da imagem seja do sul da Ibéria, é bastante seguro. Que ela tenha surgido como narrámos no texto anterior não é tão seguro; mas é muito bela a verdade que ali se encerra: todos temos de ir trilhando o caminho da perfeição até alcançarmos a estatura de Cristo. Se o nosso modelo é Jesus pequenino, tal é belo e santo; mas não se creia seja menos difícil de imitar o Jesus menino que o Jesus adulto!

Aquele texto terminava com um monge sorrindo; apesar de morto, sorria: pudera, alcançara por fim a perfeição do Paraíso! Sobressalta-nos, porém, a pergunta: e como chegou a imagem de cera do Menino Jesus de Praga à cidade de Praga?

Folheemos o velho livro de crónicas descoberto na cave de um alfarrabista de Amesterdão. Rezam as páginas desse venerável livro que, anos mais tarde, a milagrosa imagem do Menino Jesus Rei chegara, às mãos devotas de Santa Teresa de Jesus. Sempre fascinada por Jesus, Santa Teresa tinha especial devoção – aquela mesma que ensinou a seus filhos e filhas Carmelitas – pela Santa Infância do Redentor, pois que sempre tributou ao Menino Jesus especialíssima devoção!

Conta-se ainda naquele livro, que em 1547 desceu às Espanhas uma majestosa embaixada do Imperador Maximiliano da Boémia, a fim de lhe conduzir sua noiva e futura consorte, a Infanta Maria, filha de Carlos V. Conta-se também que naquela embaixada se incluía Vratislao de Pernstyn, jovem valoroso e nobre, que se prendou de Dª Maria Manríquez de Lara, dama de corte da futura Imperatriz Maria. Ao saber Teresa de Jesus dos desposórios da sua amiga Maria Manríquez de Lara com o nobre boémio, ofereceu-lhe como prenda de casamento o seu Menino Jesus Rei! E eis, assim, que a embaixada do reino da Boémia ao abandonar a Península ia bem mais rica: levava não só a futura Imperatriz da Boémia, suas damas, conselheiros e dote, bem como uma nova família, e ainda a imagem do Divino Infante, que meses mais tarde presidiria ao solar da família de Pernstyn, e que haveria de testemunhar e abençoar não só os desposórios do Imperador Maximiliano e a Imperatriz Maria, mas muitos sucessos daquela bem-aventurada nação.

A história, como se vê, tem os seus quês; e mesmo que os seus caminhos sejam ínvios ou mal-acabados, no seu decurso Deus encontra sempre formas singelas para fazer chegar a Sua bênção poderosa a todas as nações e povos.

Como chegou o Menino Jesus Rei a Praga, capital do reino da Boémia? Chegou, Deus seja bendito, no enxoval de uma jovem e bela esposa andaluza, amorosamente desposada por um nobre checo. Aquele foi um matrimónio fecundo, fiel a Deus, ao seu rei e a seu povo, visto que o Conde Vratislao de Pernstyn foi, entretanto, escolhido para Chanceler do Reino. A família viveu, primeiramente, no castelo de Litomyisl, e o Menino Jesus Rei, ali reinou, desde a capela, onde era devotamente venerado por todos. Vinte filhos nasceram a Vratislao e Maria, dos quais sobreviveram sete, e de entre as cinco meninas, a mãe Dª Maria preferia a filha Polyxena, que muito se lhe parecia em virtudes. À morte de seu amado marido Vratislao, Dª Maria de Pernstyn mudou de residência e fixou-se com os filhos no castelo da família em Praga. Ali os educou na fé católica, que por aquelas terras não era universal, pois que com ela concorria belicosamente a protestante. Em razão da sua educação na fé, a princesa Polyxena, tal como sua mãe Dª Maria Manríquez de Lara, ficarão na história da Boémia e são hoje recordadas como defensoras do catolicismo checo.

Ao casar-se Polyxena com Guilherme de Rosenberg, sua mãe ofereceu-lhe o seu maior tesoiro – a imagem do Pequeno Rei, que tanto a consolara na sua vida de esposa, mãe e viúva! Em breve, também ela ficará viúva, e à morte de seu segundo esposo – Zdenek de Lobkowitz – a princesa Polyxena de Lobkowitz entregará ao Prior do Carmo, a imagem do Menino Jesus Rei, que há tantos anos era cidadão e rei de Praga, cobrindo de bênçãos quem tão porfiadamente a Ele recorria e se confiava.

E eis que a imagem de Córdova (Espanha) chegou a Praga (reino da Boémia); das mãos de Santa Teresa de Jesus às de um dos seus filhos – Frei João Luis da Ascensão, Prior do Carmo de Praga.

Estamos, portanto, em 1628, quando a princesa Polyxena de Lobkowitz aproximando-se do pobre Convento do Carmo entregou ao seu Prior a imagem de um Menino Jesus Rei, de traços gitanos, olhos vivos, cabelos negros e alguns loiros. E entregando-lhe a preciosa oferta, lhe diz: «Aqui lhe trago, Padre, e lhe ofereço o que mais amo no mundo. Honrai muito este Menino Jesus e nada vos faltará!».

Claro que a imagem existe e ainda é venerada na Igreja de Nossa Senhora da Vitória; tem 48 cm de altura sobre um pedestal de nove. Apresenta-se coroada e vestida de rei; a mão direita está levantada para abençoar ao estilo papal, e na esquerda sustenta o mundo encimado por uma cruz.

Frei João Costa, ocd