Hoje em dia, a figura de São José está naturalmente enraizada na devoção cristã e na Igreja. Faz parte da nossa tradição e cultura colocá-lo ao lado de Jesus e Maria, como aquele que foi escolhido por Deus para custodiar o Seu Filho e ser o Seu pai terreno. Contudo, esta compreensão do papel de São José na História da Salvação e a relevância da sua figura no âmbito devocional não foi sempre tão evidente na Igreja.

Durante o primeiro milénio da era cristã, a reflexão teológica sobre São José foi muito escassa, senão rara. Foi só na Idade Média, com o aparecimento e florescimento das Ordens Mendicantes que a devoção a São José começou a desenvolver-se. E os franciscanos e carmelitas tiveram aqui um papel preponderante.
O Carmelo é uma Ordem totalmente mariana, cujas origens remontam ao séc. XIII, aos primeiros monges-eremitas do Monte Carmelo, que viviam sob a proteção da Bem-aventurada Virgem Maria. Por isso, todos os familiares de Jesus e Maria tiveram, desde sempre, um papel relevante dentro da Ordem, São Joaquim, Santa Ana e, como não podia deixar de ser, São José, o seu esposo.
A devoção a São José no Carmelo surgiu, pois, muito naturalmente, no seguimento do carisma da Ordem: viver em obséquio de Jesus Cristo, sob a maternal proteção de Maria, Rainha e formosura do Carmelo. A ligação da Ordem à Sagrada Família de Nazaré vem desde os primórdios, talvez muito influenciada por lendas inspiradas no Evangelho apócrifo do Pseudo Mateus, que narram visitas da Sagrada Família ao Monte Carmelo para conversar com os Filhos dos Profetas (descendentes do Profeta Elias), bem como outras, que falam de uma suposta paragem da Sagrada Família no Monte Carmelo na viagem de regresso do Egito.
Independentemente das lendas, a verdade, é que, a devoção a São José dentro da Ordem do Carmelo era uma realidade muito presente e o seu culto litúrgico bastante antigo.
Não se sabe com exatidão quando tiveram início as celebrações da festa de São José nas igrejas carmelitas. Provavelmente já no séc. XIV, porém, a partir do séc. XV a devoção a São José era já difundida amplamente. Na segunda metade do séc. XV, os breviários e missais carmelitas incluem a missa e ofícios próprios de São José, celebrando a sua festa com um culto solene.
Os historiadores e liturgistas atuais são unânimes em considerarem a liturgia própria da Ordem Carmelita, como o «primeiro monumento na Igreja Latina em honra de São José».
A liturgia antiga celebrava São José como aquele que fora escolhido por Deus para ser o esposo de Maria, a fim de que o Seu Filho pudesse entrar no mundo de forma honrada e escondida; celebrava a união esponsal de José com Maria, vendo-o como o protetor da sua virgindade e protetor do Filho de Deus; celebrava a pureza da Santíssima Virgem e de São José, como forma de disponibilidade a Deus, para acolher o mistério da Encarnação; celebrava, ainda, São José na sua obediência a Deus e como homem justo, humilde e trabalhador, chefe e protetor da Sagrada Família.
São José era celebrado como o espelho da vida mística carmelitana em Deus.
Foi neste ambiente que Santa Teresa de Jesus, ao entrar no Convento da Encarnação de Ávila, das carmelitas, bebeu esta devoção ao Santo Patriarca de Nazaré e que lhe foi tão especial e querida. Movida pela sabedoria de Deus e iluminada pelo Espírito Santo, numa entrega total de si mesma à vontade divina, Santa Teresa desenvolveu e expandiu a devoção josefina não só no Carmelo, mas para toda a Igreja Universal.
Ao ter levado a cabo a reforma do Carmelo e a fundação da Ordem dos Carmelitas Descalços, em 1562, com o primeiro mosteiro colocado sob o patrocínio de São José, Santa Teresa fez do culto do carpinteiro de Nazaré um dos elementos característicos da piedade e da fisionomia espiritual do Carmelo.
Teresa, por inspiração divina tinha colocado São José como o patrono do Carmelo Descalço, onde o esposo de Maria, não é simplesmente protetor, mas pai e amigo. Por isso, desde a Santa Madre Fundadora Teresa de Jesus, que os carmelitas descalços tratam, carinhosamente, o santo Patriarca, como “nosso Pai São José”.
Contemplativa, grande mística, mestra e mãe dos espirituais, Doutora da Igreja, na ciência da oração e contemplação, Santa Teresa deixou um testemunho e uma herança fundamental para a devoção e culto a São José não só no Carmelo, mas, também, para a compreensão do seu papel e missão na vida espiritual, mística e litúrgica da Igreja. Podemos dizer que ela abriu as portas para que teólogos e liturgistas desenvolvessem a reflexão josefina que veio a culminar com a proclamação de São José como Padroeiro Universal da Igreja, pelo Papa Pio IX, a 8 de dezembro de 1870.

António José Machado