As palavras tontas vencem-se pelo silêncio. E os maus intentos, pelo silêncio e pela paz até que triunfe a esperança. Outra coisa não se pedia a Frei Cirilo. E foi isso que o nosso bom frade Carmelita fez: aguardou em secreta esperança que o Divino Menino Jesus vencesse, fazendo com que a dureza dos corações finalmente se partisse e se se derramasse em cuidados para com a veneranda imagem. Espera, pois, Frei Cirilo, espera confiante, e não tardarás em ver grandes coisas, até porque o céu acaba de te dizer, pela visita da Bem-aventurada Mãe de Deus, Senhora da Vitória, que Deus está sempre mais próximo de nós que nós mesmos ou os auxílios da terra…

Eis, pois, Frei Cirilo abandonando o gabinete do Prior.

Mudo e sereno, confiante e nobre, Frei Cirilo inclina-se perante a arenga do Prior, que, certamente, com boas intenções, apesar de mais uma evidência, negara uma vez mais licença e apoio para o restauro da imagem do Divino Menino Jesus de Praga. Ah, e não esqueçamos: trata-se de uma imagem milagrosa e que havia sido profanada…

Não é um não, e muitos nãos dos homens fazem Deus ainda mais solícito.

Frei Cirilo abandona o gabinete do Prior do Carmo. Leva no coração uma pedra dura e fria em forma de não: e só lhe resta voltar para junto da imagem do Menino Jesus. É Ele o seu refúgio. Afinal, graças à Sua solicitude, depois de anos aziagos e duros, o Carmo de Praga recebera ajuda mais que suficiente para o restauro da pequena e delicada imagem. Mas nem isso demoveu os Superiores a gastar um ducado que fosse em tão boa obra!

Os nossos pensamentos às vezes são aves tontas batendo repetidamente contra janelas! Era assim que repetidamente se encontrava Frei Cirilo, batendo sempre no mesmo, o que até se compreende; mas o que não se compreende mesmo, é a renúncia e a dureza de coração dos Superiores do convento do Carmo de Malá Strana. Estava, pois, a cela posta em pesada penumbra, que muito acentuava a negrura dos pensamentos de Frei Cirilo, e… E eis que claramente ouve uma vozita, que lhe diz:

– Coloca-me junto à porta da sacristia e verás como um homem terá compaixão de mim!

Que ouviste, Frei Cirilo?; que palavras são essas claramente ouvidas em teu coração?

– Coloca-me junto à porta da sacristia e verás como um homem terá compaixão de mim!, dissera a vozita.

Sem tardança, naquela mesma noite, Frei Cirilo arremangou-se, e colocou a derruída imagem do Divino Menino Jesus de Praga, bem perto da porta da sacristia. Não fora isso que em seu coração ordenara aquela vozita juvenil? Sim, fora.

Rezam as crónicas conventuais que poucos dias depois, entrou um homem, apressado e aflito, na igreja. Era o comissário do exército imperial, que ao longo da sua longa vida disputara várias campanhas bélicas. E jamais espadas ou lanças ou canhões o haviam assustado. Porém, sempre se compadecera do sofrimento e mutilação dos seus soldados, especialmente se eram jovens. E mais lhe doía a alma quando as vítimas das guerras eram as crianças! E por essa razão, não pudera aguentar ver a imagem do Menino Jesus mutilada! Prontamente inquiriu a razão pela qual o divino Menino assim se encontrava. Pediu licença para se retirar levando consigo a profanada imagem, dizendo que a expensas suas a restauraria! E se bem o disse melhor o fez. E se bem o fez, muito mais a sua vida se viu recompensada.

Ah, e Frei Cirilo? Vendo a sagrada imagem restaurada, Frei Cirilo cuidou ser dever dançar, mas parou a tempo, pois era frade observante e os costumes santos não lho permitiam. Mas o que ele agora não sabe ou já não recorda é que São João da Cruz, seu pai, não muito antes daquele sucesso, gostava de dançar, pelo Natal, com a imagem do Menino Jesus ao colo! Devias ter bailado, Frei Cirilo da Mãe de Deus, devis ater bailado com o Menino Jesus nos braços! E assim davas continuidade a uma tradição na tua Ordem, porque dentro em breve, desde o seu altar, o Divino Menino Jesus a todos abençoa, não apenas os que entram igreja adentro, mas todos os que se sabem servos do Amor!

Os anos sucederam aos anos e jamais Frei Cirilo da Mãe de Deus duvidou do Menino Jesus, e do seu gosto em socorrer os seus irmãos Carmelitas! E agora que, restaurado e composto, tem as mãos e abençoa o mundo, Frei Cirilo acredita não existir nenhuma outra razão – (Ver o texto anterior) –  que tenha levado a Mãe de Deus a entrar pela igreja adentro, com a sua materna ajuda para o restauro da imagem.