Nunca, como neste momento em que escrevo, me lembrei tanto das palavras de São João da Cruz, no livro Chama de Amor Viva: «Para coisas profundas e espirituais geralmente não existem palavras… e no íntimo do espírito não se acerta ao falar a não ser com entranhável espírito. Ora, como vi tão pouco em mim, fui adiando até agora».
Fui pedir ajuda a outros. À minha frente estão três livros e uma folha. No livro A pandemia que abalou o mundo, Slavoj Zizek garante: «O vírus irá arrasar os alicerces das nossas vidas, provocando não só uma quantidade exorbitante de sofrimento, como um caos económico possivelmente pior do que o da Grande Recessão. Não há regresso à normalidade, o novo “normal” terá de ser construído a partir das ruínas das nossas vidas antigas, ou daremos por nós numa barbárie cujos indícios já são nitidamente visíveis». Arrasar, construir a partir das ruínas e barbárie, são palavras que me assustam e desafiam. Numa «sociedade do cansaço» (Byung-Chul Han), a caminho da barbárie, a importância dos inquietos e contemplativos é enorme. Em tempo de tempestades, em tempo de pandemia, de sofrimento e de dor, de cansaço e barbárie… Um Menino espera por ti.

De um outro livro – Demolição e Reconstrução – retiro as palavras do cardeal Walter Kasper: «A crise tornou-nos novamente cientes da nossa finitude, vulnerabilidade e mortalidade. Ela é um sinal de alarme que nos chama à reconsideração, à conversão e à renovação». Ninguém tem dúvidas de que a demolição está a trabalhar e a reconstrução tarda em aparecer. Muitos de nós ainda não estamos preparados para a reconstrução, o novo “normal” que ainda desconhecemos quase inteiramente. Estamos a passar pelo tempo das igrejas vazias e da prática cristã cada vez mais marcada pela esterilidade. Não percamos da memória a Praça de São Pedro deserta, na Páscoa de 2019, mas com o sucessor de Pedro, de pé, proclamando a mensagem da ressurreição: Cristo vive! Será aqui boa altura para lembrar os conhecidos versos de Dietrich Bonhoeffer, teólogo e mártir (1906-1945): «Pelas potências do bem, maravilhosamente socorridos, esperamos, consolados, todo o acontecimento futuro. Deus está connosco ao cair da noite e da manhã, e com toda a certeza em cada novo dia». Para quem sai dos escombros de tantas demolições, para quem sonha e deita mãos à reconstrução de si mesmo, para quem… Um Menino espera por ti.

Num terceiro livro – A alegria do Evangelho (Exortação Apostólica do Papa Francisco – deparo com um convite irrecusável: «Convido todo o cristão, em qualquer lugar e situação que se encontre, a renovar hoje mesmo o seu encontro pessoal com Jesus Cristo ou, pelo menos, a tomar a decisão de se deixar encontrar por Ele, de o procurar dia a dia sem cessar» (nº 3). Nestes tempos de angústia somos convidados a falar menos de Deus e mais com Deus, a buscar a sua força essencialmente na oração, na amizade e colóquio íntimo com Deus, pois a oração consiste, sobretudo, em estar a sós com Quem sabemos que nos ama. Oxalá cheguemos a rezar como D. António Couto: «Como é bom estarmos aqui, Senhor, mesmo sem tendas levantadas. Basta-nos o teu amor e as nossas mãos nas tuas entrançadas». Num lugar de paz e intimidade, num ambiente de oração, a sós ou em assembleia… Um Menino espera por ti!

E não desprezei a folha que me lembra uma coisa que acontece muitas vezes neste Santuário onde um Menino espera por ti. O e-mail da Isabel: «Bom dia. Venho por este meio solicitar um pedido: será possível combinar um dia para receber a bênção da minha barriguinha de grávida, uma vez que ao domingo não me é possível? Ficaria super feliz e eternamente grata!». Marcou-se o dia e a hora. Ela veio. A bênção foi dada. Ela foi e um outro e-mail rezava assim: «Muito obrigada pela disponibilidade e atenção que me foi dispensada ontem para a bênção. Adorei. Fiquei muito feliz e fico muito agradecida. Que o Menino Jesus vos encha de muita saúde e alegria. Bem-hajam. Isabel Soares».
Divino Menino Jesus, nunca te canses de esperar por mim!

Agostinho dos Reis Leal