No dia 1 de Setembro, depois de marcar presença no aniversário do meu irmão António, regressava, à tardinha, de Nespereira (Cinfães) para o convento. Para não repetir a mesma estrada de ida, vim por Ervilhais e, a dado momento, guinei para a Senhora do Castelo. Um alto monte, com uma capelinha no cimo, como a cereja no cimo do bolo. A paisagem era deslumbrante e a perder-se sempre lá no longe. Viam-se as aldeias e o rio Douro, outras montanhas e imensos vales! Num lugar místico como este, não pude deixar de recitar o místico São João da Cruz: As montanhas têm cumes, são altas, imponentes, belas, graciosas, floridas e perfumadas. Como estas montanhas, é o meu Amado para mim. Os vales solitários são tranquilos, amenos, frescos, sombreados, ricos de doces águas. Pela variedade das suas árvores e pelo canto suave das aves, oferecem grande divertimento e encanto aos sentidos e, na sua solidão e silêncio, dão refrigério e repouso: como estes vales, é o meu Amado para mim (Cântico Espiritual, 14, 6-7). É certo que também se viam incêndios e nuvens de fumo. O “alarme” ecoa pelo Universo: devastação das florestas, poluição das águas, extermínio das espécies, diminuição da camada de ozono, poluição do ambiente,… são sinais agónicos da natureza. Ela está ferida. Vamos salvar a natureza!

Também muito ferido e revoltado fiquei eu, no dia 8 de Setembro, ao saber da morte por estrangulamento, em São João da Madeira, da Irmã Maria Antónia de Pinho Guerra, da Congregação das Servas de Maria Ministras dos Enfermos. Era a “freira da moto”, a “freira radical”, a “verdadeira apóstola das periferias”, de um “sorriso simples e belo, na sua presença solidária e cristã”. O mundo está a arder e o ser humano a transformar-se num animal. A violência está a destruir o mundo e o ser humano. Vamos salvar o ser humano!

Numa cultura de prazer e sensações seduzidas, numa cultura consumista, numa cultura que proclama a liberdade entendida como autonomia que a ninguém presta contas, numa cultura onde a aspiração máxima é devorar avidamente tudo o que se apresenta, numa cultura que divide a sociedade em ganhadores e perdedores, numa cultura injusta, numa cultura onde a violência impera e faz vítimas fatais todos os dias e a toda a hora, actualiza-se o apelo da canção de Michael Jackson: Cura o mundo/, faz dele um lugar melhor/ para ti e para mim/ e toda a raça humana.

Tomás Halik, uma figura emblemática da chamada “Igreja do Silêncio”, publicou em 2008 um livro intitulado: O meu Deus é um Deus ferido. Quer-me parecer que hoje Deus está ainda mais ferido, porque a Natureza está a ser destruída, o Ser humano está a morrer por se deixar desumanizar. O Papa Francisco escreveu na Carta Encíclica Laudato si: Vivemos já muito tempo na degradação moral, baldando-nos à ética, à bondade, à fé, à honestidade; chegou o momento de reconhecer que esta alegre superficialidade de pouco nos serviu (nº 229).

Tratemos de curar o mundo, porque “ao tocar nas feridas do mundo, tocamos em Deus”.

Agostinho Leal, OCD